Em homenagem ao Dia Internacional da Mulher, a Defensoria Pública da União (DPU) no Rio de Janeiro realizou, nesta quinta-feira (10), o “Diálogo sobre o Empoderamento Feminino nas Instituições do Sistema de Justiça”. O evento aconteceu na sede da DPU/RJ e contou com a participação de representantes das diversas esferas que atuam no aparelho judiciário, que abordaram a questão da ausência de representatividade feminina nos órgãos decisórios e de poder das carreiras jurídicas.
Compuseram a mesa do evento a defensora pública federal e chefe substituta da DPU/RJ Carolina Castelliano; a também defensora pública federal e membro do Conselho Geral da DPU Daniele Osório; a desembargadora federal do Tribunal Regional Federal da 2ª região (TRF-2) Simone Schreiber; a juíza federal do TRF-2 Adriana Cruz; a advogada membro da OAB/RJ e ex-presidente do Conselho Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro (CPERJ) Maíra Fernandes; a defensora pública do estado do Rio de Janeiro e coordenadora do Núcleo Especializado de Promoção dos Direitos da Mulher (Nudem) Arlanza Rebello; a procuradora da República Ana Padilha Luciano Oliveira; e a professora da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro(UFRJ) Luciana Boiteaux.
Durante o Diálogo, foi criticada a banalização do discurso feminista nas carreiras e, em especial, a necessidade de reconhecer a existência de problemas de igualdade de gênero e a adoção de medidas para promover a maior inclusão feminina em espaços de cúpula das Instituições.
No debate entre palestrantes e plateia, promoveu-se a desconstrução do discurso simplista e alienado, que visa a imputar à própria mulher a falta de iniciativa e participação nos espaços de poder, desconsiderando todas as particularidades que marcam a vida de uma mulher em nossa sociedade machista.
As profissionais que participaram do evento relataram suas experiências e dificuldades pessoais, no intuito de romper com a lógica do patriarcado e alcançar algum espaço nas suas respectivas carreiras.
Ao fim, homens e mulheres foram conclamados a viabilizarem a efetiva ocupação feminina de espaços políticos decisórios e de representação institucional, bem como a evolução das mulheres na vida profissional, inclusive com chances reais de promoção e ascensão na carreira.
As defensoras públicas federais que se manifestaram no evento constataram que é necessário que a Defensoria Pública da União, por sua própria natureza progressista, se posicione em relação a temas sensíveis de pautas feministas, em especial pela concessão de indulto às mulheres presas, descriminalização do aborto e a necessidade de combate ao assédio dentro e fora da Instituição.
"É preciso desconstruir o discurso alienado e simplista do suposto “não querer” da mulher em ocupar posições de chefia nas instituições públicas. É necessário promover conscientização e mobilização." (Carolina Castelliano, defensora pública federal)
"Os encontros são essenciais, bem como a desconstrução do discurso patriarcal reproduzido por nós mesmas e, por fim, a conscientização porque, enquanto defensoras públicas, somos agentes de mudança junto às nossas assistidas, que estão muito mais subjugadas a esse sistema patriarcal. (...) Esse debate é um primeiro passo para promover uma conscientização nossa. (...) Temos que ter cuidado com o discurso de igualdade. Na verdade, o que buscamos é isonomia, é dar condições à mulher de ser mulher, ser mãe ou não ser mãe, casar ou não casar e, dentre as suas peculiaridades, dar condições a ela para que ascenda na carreira." (Daniele Osório, defensora pública federal)
“Essa discussão do empoderamento – colocar essa questão de gênero, essa questão feminista, as dificuldades que a mulher tem que trilhar, as barreiras que têm que ser derrubadas e alguns discursos que a gente naturaliza e que têm que ser superados – é importante para nós no serviço público e ainda mais para quem não é do serviço publico, num mundo corporativo, onde há uma desigual oportunidade pelas posições de poder e onde sequer cabe discussão.” (Simone Schreiber, desembargadora federal)
“Se temos um país como nós temos, com 51,4% de mulheres na composição da sua população, e temos, na magistratura federal, 73,8% de homens (...), isso não é natural. A primeira mulher a se bacharelar no Brasil se bacharelou em 1898; a primeira mulher magistrada só tivemos em 1954; só fomos ter uma ministra no Supremo Tribunal Federal na década de 1990. (...) Isso não é aceitável. A gente naturaliza, mas isso não é natural. O ritmo com que nós avançamos não é natural. Nesse debate, precisamos separar o que é descritivo do que é prescritivo. As coisas podem ser assim por uma razão, mas não significa que elas devem ou deveriam ter sido assim. (...) Precisamos questionar esses dados que nos são apresentados como absolutamente naturais. (...) A nossa sociedade é plural e uma sociedade plural precisa de instituições que reflitam isso. Um sistema de justiça mais justo precisa ter representantes que sejam sensíveis às necessidades das mulheres. Um tribunal que não consegue compreender não o consegue porque não passou por aquele tipo de experiência, ele não é sensível àquelas experiências. Então, é preciso que haja pessoas que sejam aptas a compreender e ter um sentido maior de alteridade. Tanto maior será a alteridade do Estado quanto mais plural for a sua composição. Representatividade é essencial para a legitimidade das instituições estatais.” (Adriana Cruz, juíza federal)
“Na advocacia privada, isso é muito mais difícil. O machismo está presente desde o momento em que a mulher se forma e vai procurar o mercado de trabalho, ou mesmo desde a época de estagiária. Somos quase 50% das advogadas e a previsão é de que, até o final 2016, as mulheres sejam maioria. Ainda assim, só temos uma presidente mulher de seccional em todo o país e, no Conselho Federal, só temos nove mulheres num conselho de quase oitenta. São cerca de apenas 10% de mulheres conselheiras. Dentro deste cenário, fica difícil aumentar a participação política das mulheres dentro da OAB." (Maíra Fernandes, advogada e ex-presidente do CPERJ)
“Há o aspecto da profissional que está no sistema de justiça e também o aspecto da mulher que é assistida e que passa pelo sistema de justiça. A trajetória é muito próxima. Todas as dificuldades relatadas pelas colegas são vividas diariamente pelas mulheres quando têm as suas histórias julgadas no crime, nas varas de família... Todos esses preconceitos e esses valores nos são jogados aos ombros de uma maneira muito contundente. (...) A Defensoria Publica do Estado do Rio de Janeiro, hoje, tem um percentual de 66% de mulheres defensoras, mas nunca tivemos uma defensora publica geral. (...) É preciso que essa desigualdade de gêneros, que as questões de gênero sejam discutidas nas escolas. É preciso que não deixemos que nosso discurso de necessidade de discussão da nossa situação e das desigualdades que vivemos diariamente vire uma ideologia de gênero, onde estão querendo efetivamente diminuir o valor desta questão, porque a ideologia é de um grupo X ou Y, e a questão de gênero não passa por ai. A desigualdade de gênero precisa ser discutida na sociedade como um todo.” (Arlanza Rebello, defensora pública do estado do RJ)
“O machismo não é só masculino. Nós mulheres também somos machistas. Todas essas questões muito intimas devem ser pensadas. Mesmo aquelas que se acham feministas deveriam fazer o exercício de pensar em que situações elas se deixam diminuir por ser mulher ou 'em que momento estou achando que um homem vai atuar melhor do que eu'. Isso não é uma luta ou uma disputa. O que queremos é conviver e estar nos mesmos lugares que eles, sem ser melhor do que ninguém.” (Ana Padilha Luciano Oliveira, procuradora da República)
“Acredito que, sem representação feminina no parlamento, continuaremos com muitos problemas e também teremos muitas dificuldades. Nesse sentido, a dita primavera feminista tem sofrido uma reação bastante dura e violenta. Estamos incomodando e a violência vem em decorrência deste incômodo, mas precisamos incomodar ainda mais. (...) Ocupar esses espaços não só para nos afirmarmos como mulheres no poder, mas também para podermos transformar a vida destas mulheres que não têm as mesmas condições que nós de ocupar esses mesmos espaços, porque são elas as que mais sofrem. Se nós temos histórias difíceis para contar, imaginem perguntar a essas mulheres o que elas vivem diariamente.” (Luciana Boiteaux, professora da Faculdade de Direito da UFRJ)
Veja mais fotos no álbum do evento, disponível na fanpage da DPU/RJ. Acesse através do link
Comunicação DPU/RJ
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