27 de novembro de 2017

DPU/RJ requer medidas para regularizar atendimento a pacientes com câncer


Diante da crítica situação em que se encontra o atendimento aos pacientes portadores de câncer no estado do Rio de Janeiro, a Defensoria Pública da União (DPU) ajuizou, nesta sexta-feira (24), Ação Civil Pública (ACP) em face da União, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) e da Universidade Federal Fluminense (UFF).

A ACP ajuizada pela DPU requer: o reabastecimento das farmácias e almoxarifados com insumos e medicamentos necessários à continuidade do tratamento dos pacientes; a realização de exames de diagnóstico, como mamografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética, entre outros, dentro do prazo máximo de até 60 dias; e ainda que, no prazo máximo de 20 dias, seja zerada a fila de pessoas que aguardam por quimioterapia, sob pena de multa diária ao secretário de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde e ao secretário-executivo do Ministério da Saúde, no valor de até R$ 50 mil reais, para o caso de eventual descumprimento.

De acordo com o defensor público federal Daniel Macedo, responsável pela ação coletiva, “o tratamento oncológico está seriamente comprometido e vem determinando o agravamento do estado de saúde física e emocional de milhares de pacientes, que, muitas vezes, chegam a vir a óbito”. Para o defensor, “o estado do Rio de Janeiro vivencia, de fato, um estado de calamidade pública na temática de Saúde. É preciso que o Governo Federal sinalize com medidas claras e objetivas, como a apresentação de um plano concreto de ações para interromper o processo de precarização do tratamento dos pacientes oncológicos em todo o País. A União deve coadjuvar o paciente e não ser partícipe deste processo de agravamento do seu estado de saúde”, afirmou Macedo.

Número de hospitais com interrupção do ciclo de quimioterapia chega a 46%

Atendendo à solicitação da Defensoria Pública da União, o Conselho Regional de Medicina do Estado Rio de Janeiro (Cremerj) realizou inspeções médicas, de outubro de 2016 a novembro de 2017, em três unidades do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva – Inca (Hospitais do Câncer I, II e III), no Hospital Federal da Lagoa, no Hospital Federal Cardoso Fontes, no Hospital Federal dos Servidores do Estado, no Hospital Federal do Andaraí, no Hospital Federal de Ipanema, no Hospital Universitário Gaffrée e Guinle (UniRio), no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (UFRJ), no Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (UFRJ), no Hospital Universitário Antônio Pedro (UFF) e no Hospital Federal de Bonsucesso, totalizando treze hospitais da rede federal.

Apurou-se que:

- 59% dos pacientes oncológicos chegam à rede federal em estado avançado da doença;
- 42% dos pacientes chegam às unidades hospitalares portando exames com prazo superior a seis meses;
- tomografia computadorizada: espera para marcação pode chegar a três meses e resultado demorar até dois meses;
- ressonância magnética: agendamento pode chegar a dez semanas e resultado demorar três semanas;
- o tempo médio de espera para realização de cirurgia oncológica é de seis semanas;
- o número de hospitais com interrupção do ciclo de quimioterapia chega a 46%; tal interrupção pode chegar a atingir 70% dos pacientes em algumas unidades, como no Hospital Federal do Andaraí e de Bonsucesso, este último com taxa de sobrevida menor do que 30%.

Subfinanciamento da Saúde, falta de concursos públicos e de gestão qualificada

Para Daniel Macedo, “o subfinanciamento da saúde, em contraste com o aumento do número de casos de câncer, é uma realidade. Os valores repassados ao Inca, na comparação dos anos de 2015 e 2016, sofreu um decréscimo de R$ 429.901.470,54 para R$ 390.170.717,26”.

Ainda segundo o defensor, a falta de concursos públicos periódicos também é uma das causas desse cenário alarmante. “O último concurso para o Inca foi realizado no ano de 2012, ao passo que, para os seis hospitais federais, o último concurso foi realizado no ano de 2010. Até janeiro de 2018, a rede federal perderá 4.200 profissionais de saúde e administrativos, diante da resistência da União em não renovar os contratos temporários”, afirma Daniel.

Outro problema apontado pelo defensor é a falta de gestão qualificada das unidades. “Não se tem uma avaliação e administração criteriosa do parque tecnológico. Aparelhos de tomografia, mamografia e radioterapia constantemente estão quebrados por falta de manutenção preventiva ou pelo simples término do seu tempo de vida útil”, relata.

Íntegra dos pedidos contidos na ACP:

1) Seja determinada à União e aos Hospitais Universitários indicados como réus a apresentação de um plano conjunto e concreto de ações no prazo improrrogável de 20 (vinte) dias, que envolva o Instituto Nacional do Câncer – RJ e o Departamento de Gestão Hospitalar – MS, para determinar o abastecimento de insumos, quimioterápicos, coadjuvantes, adjuvantes e todos os medicamentos necessários no tratamento oncológico de acordo com o protocolo terapêutico adequado e indicado pelo médico dos pacientes dos hospitais federais vinculados ao Ministério da Saúde e aos Hospitais Universitários que estão com estoque zerado, crítico ou deficiente. O plano e a sua concretização deverá abranger, necessariamente, a lista de todos os pacientes referenciados em cada uma das Unidades (indexado pelo nome do paciente, pelo tempo de espera e a gravidade do caso) munícipes ou não, com a hierarquização dos casos de acordo com a gravidade do quadro clínico de cada um e a indicação nominal, dentro do universo total de pacientes, daqueles que já tenham ultrapassado o prazo de suas necessidades terapêuticas, devendo ainda ser indicado se o tratamento foi interrompido ou não, a linha de cuidado a ser adotada, a grade completa de medicamentos oncológicos e insumos com o consumo médio mensal atualizado em cada Unidade Hospitalar e respectiva fonte de recursos de custeio. O plano apresentado também deverá conter solução que garanta a continuidade do tratamento para os pacientes vindouros (ou seja a não interrupção).

2) Seja determinado aos Réus, no prazo máximo de 30 (trinta) dias a contar da decisão liminar, reduzir a zero o quantitativo de pacientes com indicação para quimioterapia referenciados nas Unidades Hospitalares vinculadas aos réus mencionadas no corpo desta petição, que tiveram o tratamento interrompido por qualquer prazo por falta dos medicamentos e ou insumos, valendo-se para tanto, inclusive, da transferência para o tratamento oportuno em outras Unidades do Sistema Único de Saúde - Tratamento Fora do Domicílio (TFD), bem como de toda e qualquer solução administrativa que assegure resultado prático equivalente (ex. contratação emergencial etc.), apresentando, em Juízo, ao final do prazo acima, relatório com o encaminhamento dos pacientes com a relação nominal associada à respectiva solução para tratamento;

3) A implementação do processo de compra unificada em toda a rede federal relativamente aos insumos e medicamentos oncológicos em processo conduzido pelo Inca com regras claras quanto ao procedimento licitatório para aquisição dos produtos, mecanismos para aferir a adequabilidade dos valores adotados como referência nos procedimentos custeados pelo SUS, tendo por base avaliação periódica dos seus custos efetivos, de sorte a identificar discrepâncias que possam atuar como inibidoras da oferta de serviços de saúde e o plano de dispensação e controle dos insumos e medicamentos – Prazo 60 dias;

4) A condenação dos réus para que adotem todas as medidas necessárias no prazo máximo de 120 (cento e vinte) dias para a implementação em suas Unidades das ações e serviços abaixo descritos, cuja oferta é obrigatória pelos estabelecimentos de saúde habilitados como CACON e UNCACON, de acordo com a Portaria nº 140, DE 27 DE FEVEREIRO DE 2014 do Ministério da Saúde e que conforme as provas colacionadas são inexistentes ou deficientes, para que seja possível garantir o prazo previsto na Lei 12.732, vale afirmar, de 60 (sessenta) dias entre o  diagnóstico da doença até o início do tratamento:

4.1) Serviço de diagnóstico por imagem que realize, no mínimo, os seguintes exames: a) radiologia convencional; b) mamografia; c) ultrassonografia com doppler colorido; d) tomografia computadorizada; e) ressonância magnética; e f) medicina nuclear equipada com gama-câmara, todos operantes/funcionais, de acordo com as normas vigentes com equipamentos, insumos, medicamentos e pessoal que garanta o diagnóstico, resultado e análise dentro do prazo legal.

4.2) Laboratório de Anatomia Patológica, o qual realize os seguintes exames: a) biópsia de congelação; b) histologia; c) citologia; d) imunohistoquimica de neoplasias malignas, todos operantes/funcionais, de acordo com as normas vigentes com equipamentos, mobiliários, insumos, medicamentos e pessoal que garanta o diagnóstico, resultado e análise dentro do prazo legal.

4.3) A adequada e compatível oferta de consultas e exames para o diagnóstico diferencial e definitivo do câncer, e para estadiamento clínico ou cirúrgico da doença, de acordo com a modalidade de habilitação, dentro do prazo estabelecido por lei para toda a demanda de  pacientes regulados pelo município e estado do Rio de Janeiro para as Unidades Hospitalares vinculadas aos réus, devendo estes apresentarem em Juízo o cardápio por especialidade, de sua oferta de consultas e exames para o tratamento oncológico. 

A correção das deficiências dos serviços acima nos hospitais vinculados aos réus tem por finalidade viabilizar o atendimento integral da demanda atual e vindoura de todos os pacientes, munícipes ou não, com indicação para as consultas e exames, dentro do prazo de sua necessidade terapêutica, (i) seja através da estruturação e funcionamento de novos serviços  dentro da atual rede de atenção oncológica do município do Rio de Janeiro em questão com a previsão dos recursos humanos necessários, (ii) seja através da contratação de serviços junto às instituições privadas de assistência à saúde, de forma complementar, utilizando-se dos meios legais cabíveis para tornar atrativa a participação de prestadores de saúde, ou, por fim, (iii) através de outra(s) medida(s) que assegure(m) o resultado prático equivalente (art. 497 do CPC) que venha(m) a ser apresentada(s) pelos réus nos prazos acima indicados, devendo ser apresentado, no prazo máximo de 20 dias, a relação nominal dos pacientes referenciados em cada uma das Unidades (indexado pelo nome do paciente, pelo tempo de espera e a gravidade do caso) munícipes ou não, com a hierarquização dos casos de acordo com a gravidade do quadro clínico de cada um e a indicação nominal, dentro do universo total de pacientes, daqueles que já tenham ultrapassado o prazo de suas necessidades terapêuticas, devendo ainda ser indicado se o tratamento foi interrompido ou não e a linha de cuidado a ser adotada, devendo ser considerado o prazo máxima de 60 (sessenta) dias do início do diagnóstico até o início do tratamento.

5) A cominação de multa diária de até R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) ou outro valor que vier a ser arbitrado por esse Juízo (art. 11, da Lei nº 7.347/85 e art. 537 do CPC) e/ou a cominação de multa pessoal, no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), ao secretário de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde e ao secretário-executivo do Ministério da Saúde, para o caso de eventual descumprimento de cada uma das obrigações contidas em decisão liminar, tudo com incidência de juros e atualização monetária.

Comunicação DPU/RJ

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