Nesta sexta-feira (14), o auditório da sede da OAB/RJ recebeu a segunda edição do Seminário “Fosfoetalonamina Sintética e o Direito do Paciente Oncológico”. Representando a Defensoria Pública da União (DPU) no Rio de Janeiro, o defensor público federal Daniel Macedo apresentou uma exposição sobre a judicialização relacionada à liberação do uso da chamada “pílula do câncer”.
Participaram também do evento, que teve por objetivo debater a polêmica em torno desta alternativa de tratamento oncológico, os doutores em Química pela Universidade de São Paulo (USP) Gilberto Orivaldo Chierice (cientista que iniciou os estudos sobre a substância nos anos 1990) e Salvador Claro Neto; o empresário e ativista Diego Rodriguez; o pesquisador científico do Laboratório de Bioquímica e Biofísica do Instituto Butantan Durvanei Augusto Maria; e o vice-presidente do Conselho Regional de Farmácia Robson Roney Bernado.
Pesquisada há mais de duas décadas, a substância atualmente não está disponível para livre acesso aos cidadãos, que só podem optar pelo tratamento com autorização judicial. Isso porque, apesar de usuários e familiares descreverem melhora significativa da doença, a fosfoetalonamina sintética não possui registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Daniel Macedo ressaltou a relevância das ações judiciais na obtenção da fosfoetalonamina sintética, que ainda passa por diversas barreiras burocráticas para ser utilizada. Segundo ele, “com base no conhecimento fático de toda a base científica apresentada pelo Dr. Durvanei, a DPU ajuizou uma ação coletiva no estado do Rio de Janeiro com pretensão nacional; ou seja, acolhido esse requerimento liminar, ele impactaria a vida de milhares de pessoas. Dentre os pedidos, o primeiro que foi acolhido foi a formação de um grupo de trabalho, o que ocorreu no bojo do Ministério da Ciência Tecnologia e Informação. Infelizmente, começamos a observar que os testes pré-clínicos, conduzidos pelo Ministério, estavam caminhando em uma linha de má-fé, dissonantes da base cientifica”, relatou o defensor.
“A condução dos procedimentos pelo Icesp [Instituto do Câncer do Estado de São Paulo] possui graves erros metodológicos, que, parece, foram propositadamente orientados para que a fosfoetalonamina não desse certo. A única explicação que nos parece plausível para essa distorção proposital é o interesse capitalista da indústria farmacêutica, que lucra com a venda de medicamentos oncológicos e que prospera mais com a doença do que com a cura”, continuou Daniel. “Como o pedido principal da Ação Civil Pública ajuizada pela DPU foi indeferido, agravamos tal decisão e a ação ainda está em curso. Isso não impede que os pacientes ajuízem ações individuais. Temos advogados competentes, que estão ajuizando ações para que os pacientes consigam individualmente o direito de usar a fosfoetalonamina. Não é uma ação simplória. É uma ação mais complexa, mas a tutela jurisdicional ainda é o único caminho”, afirmou.
Em abril do ano passado (dia 13), a "pílula do câncer" chegou a ser liberada, através da sanção da Lei nº 13.269/2016 pela então presidenta Dilma Rousseff, porém, no mês seguinte (19/05), o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu suspender provisoriamente a lei federal, em resposta ao pedido de medida cautelar, na Ação Direta de Inconstitucionalidade, apresentado pela Associação Médica Brasileira (AMB). A decisão não suspende as autorizações para uso da substância que foram concedidas por meio de liminares em instâncias inferiores, uma vez que falta a análise do mérito pelo plenário da Corte. No entanto, novas liminares estão vetadas e o acesso às cápsulas hoje foi dificultado. Desde então, uma polêmica se instaurou entre o Estado, segmentos da sociedade civil e setores da Saúde e do Direito.
De acordo com o defensor público federal Daniel Macedo, “existem princípios e normativos que devem ser respeitados, independentemente da decisão do Supremo Tribunal Federal na ADI 5501, que liminarmente declarou inconstitucional a lei que liberava o uso da fosfoetalonamina sintética. A vida está para além desta decisão. Temos, no ambiente internacional, o direito fundamental consagrado e denominado ‘direito de tentar a cura’, que se aplica a substâncias que se mostraram promissoras. O próprio direito à vida é um direito consagrado internacionalmente e retirar o direito de tentar a cura de um paciente é ir na contramão do direito à vida. O Estado brasileiro é responsável por isso. É óbvio que se deve passar por todos os testes pré-clínicos, clínicos e em todas as suas fases, e é isso que se pleiteia. É necessário um debate cientifico, salutar, mas ainda ninguém se apresentou, de maneira séria e contumaz, para contrapor os dados científicos que comprovam a eficácia da fosfoetalonamina”, afirmou Daniel.
“Hoje, o mais importante é que o Icesp refaça os testes. Para tal, precisamos um maior engajamento social para pressionar o Ministério Público e a Defensoria Pública do estado de São Paulo, que têm atribuição para requisitar que o Icesp refaça os testes. Uma vez que houve investimento público para que o Instituto conduzisse tal procedimento e que há provas científicas de que os testes clínicos apresentam erros contumazes, isto acarretaria minimamente em improbidade administrativa, o que precisa ser apurado. É necessário que os testes avancem, numa base científica técnico-metodológica correta, para que os resultados possam ser apresentados, tanto em sede da ACP proposta pela DPU, quanto no Supremo Tribunal Federal, de modo a derrubar a liminar na ADI 5501 e propiciar a liberação definitiva da fosfoetalonamina”, concluiu o defensor.
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