25 de janeiro de 2018

Defensoria Pública da União sedia seminário sobre trabalho escravo no Rio de Janeiro



Nesta quarta-feira (24), em homenagem à Semana Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, a Defensoria Pública da União no Rio de Janeiro recebeu o II Seminário “Trabalho Escravo no estado do Rio de Janeiro: balanço dos retrocessos e perspectivas”, organizado pelo Comitê Estadual de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Estado do Rio de Janeiro (CETP-RJ) e pela Comissão Estadual para a Erradicação do Trabalho Escravo (COETRAE-RJ). Durante o evento foram apresentados os números relativos ao enfrentamento ao trabalho escravo no estado do RJ e debatidos casos nos quais as intuições presentes atuaram contra este crime. Os participantes expuseram, ainda, suas expectativas para o ano de 2018.

A mesa de abertura do seminário foi composta pelo defensor público federal Thales Arcoverde Treiger, a subsecretária de direitos humanos da Secretaria de Estado de Direitos Humanos Políticas para Mulheres e Idosos Aline Inglez, o diretor executivo da Cáritas Arquidiocesana do Rio de Janeiro Cândido Feliciano da Ponte Neto, o procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro Fábio Goulart Villela e o auditor fiscal-chefe do Ministério do Trabalho e Emprego no Rio de Janeiro Alex Bolsas.

Segundo Thales Treiger “a população que sofre diretamente com o trabalho escravo é hiper vulnerável, indo um pouco além do nosso conceito anterior de vulnerabilidade. Essas pessoas não procuram o atendimento da Defensoria Pública da União, então, nós temos que ir busca-las in loco, onde elas estão – este é o grande desafio da DPU”. O defensor ainda acrescenta que “neste momento de grande restrição de direitos sociais, é mais do que necessária a união de forças das instituições para juntas resistirmos a essas violações. O desafio é enorme e cada vez maior e mais difícil de ser enfrentado, então a parceria é realmente o melhor e mais eficiente meio de enfrentar as dificuldades que estão postas”. 


Já Aline Inglez ressalta que “no âmbito do Comitê Estadual de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Estado do Rio de Janeiro, temos nos esforçado muito em relação à municipalização das politicas e no sentido de levar o conhecimento, a sensibilização e a conscientização sobre o trabalho escravo para o âmbito local. Nessa mesma direção, buscamos capacitar os agentes públicos de as todas as áreas e setores, como saúde, educação e assistência social, para que eles possam compreender um pouco mais esse fenômeno e que tenham maior capacidade de reconhecer o trabalho escravo e reconhecer que esse tipo de exploração está muito mais próximo do que imaginamos”. Para a subsecretária de direitos humanos “é essencial o nosso trabalho em conjunto com as demais instituições, justamente para que possamos quebrar este ciclo, melhorando as condições da população como um todo, especialmente no que diz respeito a essa questão laboral, para evitar que a vítima resgatada volte a ser escravizada”.

Cândido Feliciano da Ponte Neto destaca “que no enfrentamento ao tráfico de pessoas e ao trabalho escravo o sucesso está diretamente ligado à questão da parceria entre as instituições que se encontram e se reúnem para cuidar do que é mais importante em todo esse processo: a vítima.”. O diretor executivo da Cáritas Arquidiocesana do RJ ressalta que “o trabalho escravo é uma das maiores violências sociais, porque atinge a dignidade da pessoa humana no seu mais profundo sentimento, colocando a pessoa de maneira tão degradante e cruel que é impossível que possamos traduzir e massacrando, machucando e ferindo profundamente a sua dignidade mais íntima”.

De acordo com Fábio Villela, é importante frisar “a questão da caracterização ou configuração do que seria o trabalho em condições análogas às de escravo. Tivemos há pouco tempo a Portaria 1.129 de 2017 que foi revogada, mas que nos lembra de que estão querendo restringir este conceito e que existe sim uma briga político-econômica em que se busca a restrição do que seria o trabalho escravo, o que seria um retrocesso enorme, contrariando inclusive tudo o que nós instituições parceiras a nível nacional estamos fazendo no combate e que é um compromisso assumido pela República Federativa do Brasil internacionalmente: erradicar o trabalho escravo”. O procurador-chefe do MPT-RJ acrescenta que “muitas vezes se torna necessário esclarecer que ainda que não exista a senzala nos moldes da época do negro escravizado e acorrentado do século XIX, atualmente as senzalas modernas são os barracões e os alojamentos em condições desumanas. Há muita falta de informação acerca do que é realmente o trabalho escravo e da vulnerabilidade que é um dos pilares no qual se baseia a caracterização da pessoa sujeita a este crime, situação na qual a pessoa não tem a liberdade de exprimir a sua vontade, tamanho o seu grau de sujeição. São pessoas que carecem de cidadania, não tendo sequer uma certidão de nascimento e por vezes nem mesmo nome, apenas um apelido, lhes falta o mais básico: a noção de quais são os seus direitos.” Ao que conclui afirmando que “cabe a todos esclarecer a sociedade que o trabalho escravo existe sim e deve não só ser combatido, mas erradicado. Entretanto, nenhuma instituição conseguirá isso sozinha, todos nós somos peças muito importantes nessa luta”.

Para Alex Bolsas, “temos a obrigação técnica e mesmo normativa de combater o trabalho escravo. A efetividade deste projeto, no entanto, depende das parcerias e o Ministério do Trabalho e Emprego no Rio de Janeiro está disposto a dar esse respaldo em termos de legalidade, recursos e fiscalização, se colocando como uma ferramenta para fazer esse grupo de combate funcionar”. O auditor fiscal-chefe do MTE-RJ afirma, ainda, que “não queremos apenas pregar para os convertidos, queremos mostrar para a sociedade uma presença fiscal, uma capilaridade da fiscalização, buscando uma parceria junto à comunidade para que as pessoas possam contribuir e zelar, sendo parceiros na luta contra o trabalho escravo.”.

Na segunda parte do evento, a mesa técnica, mediada pela professora da Escola de Serviço Social da Universidade Federal Fluminense (UFF) Marcela Soares, e composta por Fábio Goulart Villela; Júlia de Paula, professora de serviço social da UFF; Alexandre Lyra, auditor fiscal do MTE-RJ, e Raul Vital Brasil, coordenador do Grupo de Combate ao Trabalho Escravo no Rio de Janeiro, apresentou dados estatísticos do trabalho escravo no estado e o balanço das ações de combate, bem como exemplo de casos emblemáticos nos quais atuaram. Na sequencia, o debate foi aberto ao público que pode fazer comentários e perguntas aos palestrantes.



Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo

O dia 28 de janeiro foi escolhido como Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo pela Lei nº 12.064/2009. A data faz referência ao crime que aconteceu em janeiro de 2004 e ficou conhecido como Chacina de Unaí, quando quatro funcionários do Ministério do Trabalho e Emprego foram assassinados durante uma fiscalização em uma fazenda, na investigação de denúncias de trabalho escravo.

Segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), estima-se que ainda existem pelo menos 27 milhões de escravos e escravas em todo o mundo. No Brasil, cerca de 70% dos resgates de trabalhadores ocorreram em atividades rurais. Os dados mais alarmantes referem-se à pecuária, café e madeira. Extrativismo vegetal e carvão vêm logo em seguida, conforme dados oficiais reunidos pela Comissão Pastoral da Terra (CPT).  


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