Nesta
quarta-feira (13/06), o defensor público federal Renan Vinícius Sotto Mayor participou
do “Seminário sobre a Política Municipal
para a População em Situação de Rua - Pela Efetivação da Lei Maria Lucia
Pereira (6.350/2018)”, realizado no auditório da Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB). O evento foi promovido pelo Fórum Permanente Sobre População em
Situação de Rua do Estado do Rio de Janeiro, o Fórum Popular do Povo da Rua da
Baixada Fluminense, o Movimento Nacional da População de Rua (MNPR), o Projeto
Vidas Invisíveis, a Defensoria Pública da União (DPU), a Defensoria Pública Geral
do Estado do Rio de Janeiro (DPGE/RJ), a OAB/RJ e a Comissão Especial de
Políticas Públicas para a População em Situação de Rua da Câmara Municipal do
Rio de Janeiro.
O
seminário teve por objetivo apresentar a Política Municipal para População em
Situação de Rua, instituída através da Lei 6.350/2018, aos órgãos públicos competentes
envolvidos (DPU, DPGE, Secretarias Municipais de Assistência Social e Direitos
Humanos, Educação, Saúde, Urbanismo, Infraestrutura e Habitação, Emprego,
Desenvolvimento e Inovação, Conservação e Meio Ambiente, Cultura e Casa Civil),
Guarda Municipal e Secretarias de Assistência Social de Municípios limítrofes.
“A
história da população em situação de rua
é a história da criminalização da
população em situação de rua”
“A
gente tem que se apropriar dessas leis”, afirma Renan. “Infelizmente, não basta
uma previsão legal. A história da população em situação de rua é a história da
criminalização da população em situação de rua. Para criminalizar as pessoas
que estão nessa situação, nós já temos legislação há muito tempo. O Código Penal
do Império, de 1830, já criminalizava. Estar em situação de rua era considerado
crime. O Código Penal de 1890 continuou prevendo a criminalização das pessoas
em situação de rua. Passamos então a 1941. A Lei de Contravenções Penais prevê
a mendicância e a vadiagem. A primeira só foi revogada em 2009, enquanto que a
segunda continua em vigor até hoje, mesmo que não seja compatível com a Constituição”,
informa.
O
defensor público explica que o sistema jurídico brasileiro é claramente
excludente para a população em situação de rua. “Se uma pessoa não tem CPF ou
comprovante de residência, ela não pode ter acesso à Saúde ou a algum serviço socioassistencial
ou ao INSS. Ela, no entanto, não deixa de ser presa. No sistema penal, todos
são aceitos, independentemente de ter documentação ou não”, exemplifica. “Com
base nisso e na Lei de Contravenções Penais, um juiz de São Paulo, em 2009, determinou
a prisão de várias pessoas em situação de rua sob a alegação que estariam
praticando a contravenção penal de vadiagem. A Defensoria Pública do Estado de
São Paulo, então, teve uma atuação brilhante, impetrando uma ação de habeas corpus e o Tribunal de Justiça
declarou a inconstitucionalidade dessa lei. Ocorre, porém, que o alcance dessa
decisão é restrito ao âmbito do estado de São Paulo”, lamenta.
“Criminalizamos
desde 1830 e só dedicamos alguma atenção a direitos sociais em 2005”
De
acordo com Renan, “em relação aos direitos sociais, o primeiro marco legal é de
2005, quando, de forma bem discreta, foi incluído, na Lei Orgânica da
Assistência Social (LOAS), um dispositivo falando de atendimento especifico
para população em situação de rua. Então, podemos dizer que criminalizamos
desde 1830 e, para direitos sociais, apenas dedicamos alguma atenção em 2005 e,
ainda assim, de forma bem discreta”, conclui.
Em
2009, veio o decreto 7.053, que institui a Política Nacional para a População
em Situação de Rua e seu Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento.
Na opinião do defensor, não foi suficiente. “Apenas agora, temos de fato uma
lei, um marco legal no município do Rio de Janeiro, graças à batalha de toda a
sociedade civil e dos vereadores, que felizmente conseguiram aprovar a lei e
derrubar o veto. Assim, podemos dizer que, sob o ponto de vista legal, o Rio de
Janeiro está mais avançado que o plano nacional, porque, em nível nacional, só
temos um mero decreto, que pode ser revogado, a qualquer momento, sem maiores
entraves, pelo presidente da República”, explica.
“A
Lei Municipal 6.350 já está valendo, independente da criação do Comitê”
O
defensor público federal considera que é necessário batalhar para que o Comitê Intersetorial
saia do papel. “Não adianta apenas a previsão legal. Precisamos ainda de uma
ação do Executivo em relação à criação do Comitê”, diz ele, que, no entanto, alerta
para o fato de que a lei já está em vigor no que diz respeito à política
pública. “A política para a população em situação de rua já existe, independente
da criação do Comitê. As instituições e profissionais que lidam com este
público, bem como todas as pessoas que se encontram nessa situação, devem
conhecer a Lei Municipal 6.350. As pessoas devem se apropriar desta lei, que já
está em vigor”, destaca.
Renan
Vinícius exemplifica. “A lei cita como um dos seus princípios ‘a erradicação de atos violentos e ações
vexatórias e de estigmas negativos e preconceitos sociais que produzam ou
estimulem a discriminação e a marginalização, seja pela ação ou omissão’.
Então, todo tipo de abordagem à população em situação de rua tem que ser feita,
prezando pela dignidade daquelas pessoas. Temos que divulgar essa lei na rua.
Caso alguém seja abordado de maneira vexatória, essa pessoa precisa conhecer a 6.350
para que possa se defender do agente que estiver fazendo tal abordagem, invocando
a proteção da lei”, esclarece.
O
defensor continua. “A lei cita ainda ‘o respeito
à liberdade de decisão em relação à permanência em situação de rua ou adesão
voluntária ao acolhimento institucional’. A Defensoria Pública da União tem,
em parceria com a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro e a sociedade
civil, realizado as Rondas de Direitos Humanos (Ronda DH), nas quais os
defensores saem às ruas para prestar atendimento a essa população.
“Criação
do Comitê será o marco inicial para se começar uma política de fato”
Renan
Vinícius considera que a criação do Comitê Intersetorial é fundamental. “Será o
marco inicial para se começar uma política de fato, devidamente integrada entre
todos os agentes envolvidos. Atualmente, temos políticas fragmentadas por
trocas de gestão. Com a criação do Comitê, será possível debater e pautar a política
pública, de modo a definir um foco e fixar qual a política de ação,
independente do secretário que estiver ocupando o cargo. Poderemos atuar, de
forma Intersetorial com a assistência social, políticas de Trabalho, Emprego, Habitação,
Saúde, reunindo todas as secretarias, a sociedade civil, o Movimento da População
em Situação de Rua, a Defensoria Pública da União, a Defensoria Pública do estado,
o Ministério Público, o Tribunal de Justiça, enfim, todos juntos e organizados em
torno do Comitê, atuando pela implementação da lei e pela efetivação dos
direitos fundamentais da população em situação de rua”, finaliza.
Conheça
a Lei 6.350/2018, clicando AQUI.
Comunicação DPU/RJ
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